Um erro que educador algum pode cometer é acreditar que trabalhar a inclusão seja tarefa fácil ou se resuma na adoção de uma ou de outra situação de aprendizagem. Essa questão é extremamente ampla e por envolver valores e preconceitos que estão arraigados em nossa cultura e introjetados em nossa mente, um trabalho verdadeiramente sério implica em projeto de estruturação progressiva e mudança significativa. É por essa razão que o que nesta crônica se procura não é resolver os arraigados princípios que delimitam a inclusão, antes propiciar um momento em sala de aula que possa despertar pensamentos sobre porque excluímos. Sabemos que esta contribuição é quase nada, mas também não ignoramos que não se constroem viadutos sem a participação singela de pequeninos tijolos.
Justificada a intenção, vamos à ação. Ao entrar em sala de aula avise os alunos que vai desenvolver estratégia diferente, sem especificar que objetivos procura alcançar. E deixando alguma curiosidade no ar, distribua a cada aluno uma folha de papel tamanho ofício, solicitando que, com letra de forma, escrevam seu nome ao alto.
Tarefa concluída avise-os que vai marcar dois minutos e que nesse espaço de tempo, deverão deixar seus lugares e colher autógrafos, isto é, devem obter em sua folha o nome dos colegas e deixar na folha dos mesmos o seu nome. Desnecessário dizer que é esse um momento de extrema agitação. Ainda que não se tenha dito que importa colher muitos autógrafos, os alunos compreendendo os limites do tempo disponível buscam afoitos cumprir a tarefa. Passado os dois minutos, avisa-se que essa etapa da atividade está concluída.
Agora com os alunos sentados em círculo solicita-lhes que examinem suas folhas, contando quantos autógrafos (legíveis) foram coletados. Simule uma competição, destacando quem mais e quem menos autógrafos obteve. Após esse breve debate, interrogue-os buscando saber quantos autógrafos acreditam ter assinado. Os alunos constarão, com alguma surpresa, que não sabem responder a essa questão. Percebem quantos autógrafos colheram, mas fazem vaga idéia de quantos atribuíram.
Essa situação enseja uma oportunidade para debates, com o professor interrogando: Por que é assim? Porque valorizamos mais a conquista que a entrega? Porque fazemos da colheita e não da oferta à razão de nossas ações? Será que ao colher autógrafos, não valorizamos mais o "eu" que o "ele"? É evidente que o objetivo dessas questões não são as respostas certas ou erradas. Estas inexistem; o que as perguntas visam é a reflexão, a internalização da fala, a conversa interior que tem o aluno consigo mesmo e com seus colegas buscando explicar o que à primeira vista parece não compreender.
A provocação desse desafio na classe abre perspectiva para se indagar se essa visão egocêntrica que temos não pode ser mudada. O que sugerem para melhor se perceba o outro? Em que medida essa preocupação em se colher, não macula a grandeza do proporcionar? Na atividade buscou-se colher autógrafos, mas a coleta era impossível sem a oferta. Será que na vida, isso não ocorre? Se transpusermos a obtenção de autógrafos que a estratégia propiciou para nossas ações de todo dia, não servirá à mesma como lição? O essencial não é que o professor fale, mas que saiba ouvir. Suas perguntas não pretendem dar lição de moral, antes propiciar a reflexão e o diálogo, a conversa entre eles e a conversa interior de cada um deles.
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